Por mais uma família seja unida e seus membros tenham um bom relacionamento, quando ocorre o falecimento de alguém e é preciso dar início ao processo de inventário de seus bens para que sejam repartidos entre os herdeiros, é comum que ocorram discussões, geralmente são motivadas por pessoas que podem se sentir injustiçadas em relação ao que irá receber.

A extrema morosidade do Judiciário no caso de ações relacionadas a heranças – sobretudo quando existam discordâncias, estejam envolvidos menores de 18 anos ou pessoas com algum tipo de deficiência que a impeça de decidir sobre esse tipo de questão prática, capaz de afetar seu sustento e sua qualidade de vida) ou o falecido tenha deixado testamento -, acaba tornando a situação ainda mais complicada, aprofundando inimizades e levando a uma estagnação do processo sucessório, que pode levar anos em casos extremos décadas para ser finalizado no Judiciário.

Para driblar a lentidão do Judiciário, a holding familiar é um instrumento jurídico que permite realizar um planejamento sucessório mais compreensivo e transparente, dando ciência a cada membro da família quais serão as suas respectivas cotas e buscando um consenso e uma solução que acomode os interesses de forma satisfatória antes que aconteça, de fato, o falecimento de alguém da família.

Além disso, criar uma holding familiar também acaba proporcionando benefícios tributários, na medida em que acaba reduzindo a carga de impostos cobradas em procedimentos sucessórios comuns, tornando o planejamento sucessório extremamente importante para quem não quer ter seu patrimônio dilapidado, além de reduzir outros gastos.

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O que é Holding Familiar

A definição de holding, para o especialista em direito empresarial André Luiz Santa Cruz Ramos, é de “uma sociedade cujo objetivo é a participação em diversas empresas”, sendo que Gladston Mamede faz uma distinção entre os tipos possíveis: “Holding é uma sociedade que detém participação societária em outra ou de outras sociedades, tenha sido constituída exclusivamente para isso (Sociedade de Participação), ou não (Holding Mista). “

Ou seja, a holding pura, por assim dizer, é apenas uma sociedade que controla outras empresas, tendo, portanto, participações em mais de uma companhia. No caso da holding mista, além de administrar essas participações societárias, a própria holding também desenvolve uma atividade econômica, buscando auferir lucros por conta própria.

O conceito surgiu no direito brasileiro com a Lei das Sociedades Anônimas de 1976, que dispões em seu artigo 2º que uma “companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades, ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objetivo social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais. ”

Por conta disso, alguns autores criticam o uso do termo holding já que não existe uma previsão expressa na lei sobre o termo, mas a lei citada anteriormente claramente permite que sejam constituídas sociedades no formato que são conhecidas as holdings nos Estados Unidos, onde o termo surgiu no século 19.

De qualquer forma, no caso da holding familiar, a diferença é que, em vez de sócios unidos pelo interesse comum de unir forças para e expandir seu capital e seus negócios por meio de uma parceria focada exclusivamente na busca por lucros, a holding familiar tem uma preocupação maior com o bem-estar dos membros da família e busca garantir condições para que usufruam do patrimônio conquistado por determinada pessoa, seja o patriarca ou a matriarca da família, um filho(a) prodígio ou quem quer que seja, para que o seu falecimento não leve a brigas e processos judiciais intermináveis, que muitas vezes acabam sendo fatais para um negócio, que pode ir à falência caso não haja um planejamento sucessório adequado.

Como funciona uma Holding Familiar

Por meio da holding familiar, é possível obter uma maior segurança jurídica, simplificando a partilha de bens e realizando uma espécie de inventário antes de um falecimento. Isso pode ser feito, por exemplo, com a integralização da participação acionária de cada membro da família que teria direito natural à herança, de modo que, quando ocorra a morte, as ações sejam transferidas aos herdeiros em uma proporção pré-determinada, que é estabelecida pelo proprietário dos bens e quem de fato constituiu os negócios e o patrimônio familiar.

Para isso, a holding familiar prevê a constituição de uma sociedade empresária que detenha o patrimônio familiar integralizado em seu capital social. Após essa constituição, é possível determinar as quotas de cada herdeiro, sejam sociais ou acionárias, cuja transferência pode ser feita por cláusula de doação.

Além dessa transmissão direta, também é possível determinar o usufruto de bens para os herdeiros, evitando que sejam vendidos com cláusulas específicas e buscando possibilitar que os herdeiros atuem na gestão da sociedade e do patrimônio, o que deve ser discutido previamente, já que isso depende da concordância deles.

De forma geral, portanto, a holding familiar permite a quem tem um patrimônio  fazer uma repartição não apenas de quanto cada um de seus herdeiros irá receber, mas também quem ficará encarregado de gerir as empresas e determinados patrimônios que geram renda para que a família possa continuar se beneficiando de uma sucessão rápida, racional e previamente acordada com os herdeiros. A criação de uma Holding Familiar tende a reduzir bastante os problemas relacionados à sucessão de bens, os custos tributários desse processo e as eventuais brigas que surgem quando tudo é deixado para depois da morte do proprietário dos bens.

Com esse planejamento, que constitui a participação societária de cada unidade  familiar, é possível realizar uma separação dos ativos e determinar as partes que serão deixadas a cada um sem que seja necessário passar pelo desgaste de um inventário judicial e os impactos que ele provoca nos negócios da família, que acabam não sendo bem administrados quando existe uma situação conflituosa.

Mas não é apenas após o falecimento que o fundador do “império familiar” poderá realizar a partilha de seus bens. Ele também pode fazer a gestão da holding em vida experimentando colocar determinado herdeiro na direção de um negócio para reconhecer quem tem maior capacidade gerencial e de administração. Por meio desses atos, o principal proprietário de bens acaba criando uma nova estrutura organizacional ainda em vida.

Além do testamento, a doação também é uma forma legítima de expressão de vontade e tem um aspecto bilateral, já que exige a aceitação do beneficiário. Ao contrário do testamento, no entanto, ela pode ser revogada qualquer momento e de forma unilateral.

Vantagens e Desvantagens

Dados do IBGE de 2017 apontam que 90% das empresas brasileiras seguem o modelo familiar. No entanto, uma pesquisa compreensiva realizada em 1997 aponta que 70% dos empreendimentos familiares no mundo não resistem à morte do fundador e acabam falindo por má gestão ou acabam tendo suas atividades interrompidas por falta de interesse dos herdeiros em dar continuidade ao negócio.

Uma das óbvias vantagens da holding familiar, portanto, é evitar essa tendência por meio de um planejamento sucessório que discuta o papel que os herdeiros irão desempenhar na herança e gestão das empresas e bens após o falecimento do fundador dos principais negócios da família, identificando quem tem mais competência gerencial e de fato queira atuar nos negócios da família, já que a sua concordância é fundamental.

Também permite incluir pessoas que não receberiam nada no caso de uma sucessão legal, que é aquela que ocorre com base apenas na lei e que prevê um mínimo para os chamados herdeiros necessários (além de prever como será feita toda a partilha caso não haja nenhum outro instrumento determinando a vontade do falecido, como um testamento ou o instituto da holding familiar), e alterar o percentual recebido por alguns herdeiros no caso de uma

Além disso, o processo possibilita maior agilidade, já que evita a dependência dos trâmites judiciários e questionamentos litigiosos e permite que as quotas sejam distribuídas de acordo com uma proporção previamente determinada em cláusulas que devem constar do contrato social da holding familiar.

Por fim, além desse planejamento sucessório em vida, capaz de minimizar discordâncias e realizar uma sucessão mais eficiente, a holding familiar também possibilita uma proteção do patrimônio familiar, já que permite economizar com tributos, gastos com advogados e taxas judiciais, assim como evitar uma suspensão do aproveitamento econômico de bens e da geração de renda por empresas por conta de litígios, já que decidir de antemão quem irá gerenciar o patrimônio após o falecimento garante maior continuidade e evita interrupções.

É importante, no entanto, notar que o uso da holding familiar como instrumento para um planejamento sucessório não significa que o fundador dos empreendimentos pode estabelecer qualquer valor que achar cabível para cada membro da família com base em critérios subjetivos, uma vez que a lei civil estabelece que existem herdeiros necessários, ou seja, que devem necessariamente receber determinada quantia no caso de seu falecimento, que podem ser resumidos basicamente em descendentes, ascendentes e cônjuges.

Além dessa restrição, também é necessário respeitar o regime de bens que foi estabelecido caso a pessoa fosse casada no momento em que faleceu, com parte dos bens tendo que ir necessariamente ao cônjuge se o regime não for de separação total de bens.

A holding familiar também pode representar alguns problemas, como a possibilidade de acabar concentrando nela o processo decisório das empresas e acabar alienando e desmotivando os funcionários de cada empresa, que acabam perdendo relevância e autoridade com a formação da holding. Outra desvantagem possível é a questão do custo da própria holding, que é uma pessoa jurídica com responsabilidades legais e fiscais, sendo necessário gastar com contadores e advogados para a sua criação e manutenção.

Também acaba tornando a disposição dos bens que acabaram se tornando parte do capital da holding mais difícil por parte do seu proprietário, já que ao estabelecer cláusulas de doação e de usufruto fica mais difícil, por exemplo, vender determinado bem em uma situação de emergência econômica, já que ele estaria com restrições de alienação.

No fim das contas, no entanto, a maioria dos especialistas no setor tende a considerar que, ao pesar as vantagens e desvantagens, optar pela constituição de uma holding familiar acaba sendo mais vantajoso, sobretudo pela proteção do patrimônio com uma maior sobrevida dos negócios familiares e atribuição mais rápida de responsabilidades na gestão dos negócios, além da redução dos litígios entre os herdeiros em processos judiciais que podem durar anos.

Como Fazer uma Holding Familiar

A criação de uma holding familiar passa pela criação de uma sociedade anônima de acordo com a Lei das Sociedades Anônimas de 1976, que precisa ter como objeto participar de outras sociedades, ainda que isso não esteja previsto em seu estatuto necessariamente.

Ao optar por criar uma holding familiar é preciso fazer um planejamento fiscal e tributário adequado, além de que será necessário implantar um modelo de gestão mais profissional em todas as empresas que farão parte do grupo., portanto os administradores das empresas do grupo precisarão estar comprometidos com as mudanças na forma de gerenciar o negócio.

Ou seja, a constituição de uma holding familiar não é um processo dos mais simples, exigindo todo um planejamento meticuloso, e é por isso que a assessoria de profissionais especializados se torna tão necessária.

Além disso, a holding familiar tem como função a proteção do patrimônio da família injetado na companhia, sobretudo por meio de uma gestão eficiente. Dessa forma, o principal motivo para a sua constituição é dar continuidade ao negócio da família e ir eliminando os processos existentes que possam acarretar prejuízos financeiros aos sócios.